Isolamento no inverno da Antártica e as relações interpessoais entre membros da base

Muito recentemente, os media foram inundados pela história de um cientista polar que esfaqueou um colega numa base na Antárctica, por este lhe ter estrago sucessivamente o final de vários livros. Situações como esta são um exemplo muito claro do desafio psicológico que é viver e trabalhar durante longos períodos de tempo num ambiente isolado, confinado e extremo. Para as equipas de cientistas e logísticos que vão passar o inverno numa estação na Antárctica, as relações interpessoais que acontecem entre as pessoas que vivem dentro da base são fundamentais para garantir o bem-estar do grupo e o cumprimento das tarefas diárias.

No entanto, a forma como estas relações interpessoais evoluem ao longo de toda a duração da campanha parece sofrer uma mudança significativa mais ou menos a meio. Com efeito, a análise dos comportamentos interpessoais de 23 indivíduos que passaram 14 meses numa estação na Antárctica, sugere que durante a primeira metade da campanha existe uma tendência para um aumento e melhoria das relações interpessoais dentro da base, e que a partir do início da segunda metade da campanha há uma deterioração da qualidade das relações interpessoais que já estavam estabelecidas. Se por um lado os membros da base demonstram ter necessidade se relacionar com outras pessoas e se sentirem ligados a elas, por outro lado querem fazê-lo sem ter que interagir muito ou estabelecer uma ligação afetiva mais forte.

Curiosamente, esta deterioração ou arrefecimento das relações interpessoais não acontece necessariamente por as pessoas dentro da base se desenvolverem más relações e entrarem em conflito. O que parece acontecer é que a necessidade de estabelecer relações interpessoais mais profundas, em que os indivíduos falam dos seus sentimentos ou se sentem acarinhados diminui ao longo do tempo. Uma espécie de mecanismo de adaptação à vida em isolamento. Como consequência, se por um lado a interação entre os membros da base se torna menos frequente, por outro lado cada individuo parece tornar-se mais competente a gerir as suas próprias relações e isso é fundamental para o sucesso da campanha.

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Fonte: Paul, F. J., Mandal, M. K., Ramachandran, K., & Panwar, M. R. (2010). Interpersonal behavior in an isolated and confined environment. Environment and Behavior, 42(5), 707-717. doi: 10.1177/0013916509336889

Autor: Pedro Quinteiro

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