Durante mais de 80 anos, cientistas de países que participam no Tratado da Antártida têm realizado investigação na Antártida, construindo estações de pesquisa por todo o continente. Estas estações são essenciais para a realização de pesquisas científicas e proporcionam condições de vida para estadias prolongadas, permitindo estudos aprofundados que de outra forma seriam impossíveis.
Atualmente, existem 112 estações na Antártida, sendo que 62 estão localizadas em regiões costeiras para facilitar o acesso. No entanto, apesar destas estações terem beneficiado grandemente empreendimentos científicoscientíficas, também introduziram desafios ambientais que anteriormente não existiam. Este artigo centra-se nos efeitos ambientais da estação australiana “Casey” no ambiente marinho circundante.
A estação original de Casey foi construída na década de 1960 na Península de Bailey, em substituição a uma estação australiana anterior. Devido à má qualidade da construção, a estação foi desmantelada na década de 1980, e uma nova estação de Casey foi construída a 1 km de distância (Fig 1). Hoje, esta nova estação é composta por 18 edifícios permanentes que podem alojar até 120 pessoas, com uma população média de 25 no inverno e 90 no verão.
Até 1986, os resíduos sólidos da Estação Casey eram depositados num local no Vale Thala (Figura 2), causando contaminação ambiental na Baía Brown devido à erosão e aos cursos de água do degelo que transportavam material contaminado para as águas. Após a assinatura do Protocolo de Proteção Ambiental ao Tratado Antártico (Protocolo de Madrid), em 1991, a Austrália teve que remover a maioria dos resíduos da Antártida, o que resultou em melhorias na gestão de resíduos e proteção ambiental. Foram feitos esforços para remediar o local de deposição de resíduos no Vale Thala, incluindo a remoção de resíduos, a construção de trincheiras para água derretida e a instalação de uma estação de tratamento de água para evitar uma maior contaminação das águas próximas. As concentrações de contaminantes metálicos no solo e no leito marinho também foram avaliadas, e foi iniciado um programa de monitorização para avaliar a eficácia destas medidas.
Através da análise de amostras de sedimentos de 1997 a 2015, com foco nas variações nas propriedades dos sedimentos e nos contaminantes, o estudo revelou um claro sinal de contaminação antropogénica no ambiente marinho em torno da Estação Casey. Foram encontrados múltiplos poluentes nos sedimentos marinhos em níveis várias ordens de magnitude superiores aos locais de controlo.
A Brown Bay (adjacente ao antigo local de deposição de resíduos) apresentava maiores níveis de contaminação do que em qualquer outro local, a Shannon Bay (local de despejo de águas residuais) e o Wharf Casey também tinham concentrações consistentemente mais elevadas de contaminantes do que os locais de controlo, enquanto Wilkes (adjacente a um local mais antigo de deposição de resíduos) tinha níveis mais baixos e a maioria dos contaminantes, estando próxima dos valores de controlo. Surpreendentemente, a Brown Bay “Exterior” apresentou um aumento nas concentrações de contaminantes de 2000 até 2014, sugerindo o movimento de contaminantes ligados aos sedimentos dos locais interiores para exteriores, possivelmente devido à sua ressuspensão e transporte lateral. Estes padrões de contaminação coincidem com a distância em relação à localização atual da estação, quanto mais próximo o local, maior a contaminação.
Os níveis de contaminação nos locais em redor de Casey revelaram ser muito superiores aos encontrados em outras estações australianas, mas semelhantes aos das áreas afetadas pela Estação McMurdo, dos EUA. Os níveis de contaminação na Brown Bay são também semelhantes a alguns estuários fortemente modificados em todo o mundo, como o Porto de Sydney e de Rio de Janeiro, podendo ter efeitos significativos na saúde das espécies de peixes bentónicos, como observado noutras estações. No entanto, o artigo destaca que a extensão espacial da contaminação em torno das estações antárticas é provavelmente limitada a alguns quilómetros da estação devido à natureza calma dos ambientes submarinos costeiros na Antártida.
Em resumo, o artigo sublinha os impactos ambientais associados às Estações, como a Casey, na Antártida. Embora essas bases sejam essenciais para a pesquisa científica, devem ser geridas com cuidado para mitigar os efeitos ecológicos neste ambiente sensível e intocado.
Autor: Lucas Bastos
Referencias: Stark JS, Johnstone GJ, King C, Raymond T, Rutter A, Stark SC, et al. (2023) Contamination of the marine environment by Antarctic research stations: Monitoring marine pollution at Casey station from 1997 to 2015. PLoS ONE 18(8): e0288485. DOI: 10.1371/JOURNAL.PONE.0288485