Pinguim-de-adélia como bioindicador de concentrações de mercúrio

Desde a revolução industrial, as concentrações de mercúrio (Hg) no ambiente têm vindo a aumentar devido a atividades antropogénicas. Este metal possui um efeito tóxico nos animais e humanos, pelo que em 2013 foi adotada por mais de 140 países a Convenção de Minamata sobre o Mercúrio, de forma a proteger a saúde humana e o ambiente. O Hg dispersa por todo o mundo através de correntes atmosféricas, depositando-se até nos locais mais remotos, como por exemplo, nas regiões polares.

As aves marinhas como predadores de topo refletem a contaminação de Hg que está presente na sua cadeia trófica, através de processos de biomagnificação, sendo que a principal forma de excreção de Hg nestes animais é através da troca de penas. Dentro das aves marinhas existe uma espécie que possui um conjunto de características ideais para servir de bioindicador para as concentrações de Hg nas cadeias alimentares da Antártida: o pinguim-de-adélia (Pygoscelis adeliae) (Figura 1). Esta espécie tem uma distribuição circumpolar e é a espécie de pinguim mais comum e abundante do continente Antártico.

Figura 1 – Pinguim-de-adélia (Pixabay).

De forma a ser feita uma avaliação circumpolar das concentrações de Hg, foram recolhidas amostras de penas de 538 indivíduos (490 adultos em idade reprodutiva e 48 crias antes da saída do ninho) entre os anos de 2005 e 2021 em 24 colónias ao redor do continente. Para cada amostra foi medida a concentração de Hg total (T-Hg). Através das penas, também foram determinados os valores dos isótopos δ13C e δ15N, usados como proxies para o habitat e posição trófica dos pinguins, respetivamente.

Ao nível circumpolar, a contaminação por Hg revelou-se relativamente homogénea entre as diferentes regiões avaliadas. No entanto, foi observado um ‘’hotspot’’ (local de grande concentração) de Hg no mar de Ross (Figura 2), associado a uma posição trófica mais alta dos pinguins-de-adélia, provavelmente devido a uma maior proporção de peixe nas suas dietas.

Figura 2 – Variação espacial nas concentrações de Hg nas penas de pinguins-de-adélia (a) adultos e (b) crias em 24 colónias antárticas. O gradiente de cor representa concentrações crescentes de Hg. O tamanho das amostras (n) é indicado pelo tamanho dos círculos e triângulos. A posição média da Frente Polar (linha preta tracejada) reflete o limite norte da distribuição do pinguim-de-adélia.

É fundamental continuar a monitorizar as concentrações de Hg, de forma a avaliar a eficácia da Convenção de Minamata sobre o Mercúrio. Avaliações em larga escala são extremamente importantes para monitorizar o estado de contaminação das cadeias alimentares da Antártida ao longo do tempo e também para avaliar as tendências globais, tendo em consideração o contexto das alterações climáticas.


Autora: Sara Santos

Referência: Cusset, F., Bustamante, P., Carravieri, A. et al. Circumpolar assessment of mercury contamination: the Adélie penguin as a bioindicator of Antarctic marine ecosystems. Ecotoxicology 32, 1024–1049 (2023). https://doi.org/10.1007/s10646-023-02709-9

DOI: https://doi.org/10.1007/s10646-023-02709-9

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