A Antártida em 2070

Apesar de a Antártida ser a região mais remota da Terra, ela está intimamente ligada ao sistema climático do planeta. Assim, o futuro do nosso planeta e da sociedade humana estão também dependentes do futuro da Antártida.

Da perspetiva de um observador situado em 2070 e que decida olhar para trás no tempo, há duas narrativas possíveis para a evolução da Antártida e do Oceano Austral: i) as emissões dos gases com efeito de estufa permaneceram inalteradas, o clima continuou a aquecer e a resposta política não foi efetiva, levando a alterações profundas na Antártida e Oceano Austral que se repercutiram no resto do globo; ii) foram tomadas medidas ambiciosas para limitar as emissões dos gases com efeito de estufa e para estabelecer políticas que reduzissem a pressão humana sobre a Antártida, levando a uma diminuição da taxa de transformação deste continente.

Situados em 2070 e olhando para trás, de acordo com o cenário de elevadas emissões: a temperatura na Antártida aumentou cerca de 3°C; as águas do Oceano Austral aqueceram de forma geral mas a sua zona superficial arrefeceu devido ao aumento do derretimento de glaciares; quase um quarto do volume das plataformas de gelo foram perdidas nos últimos 50 anos, levando a um aumento de mais de 10 metros no nível do mar; a extensão do mar de gelo reduziu-se em metade no verão e em 40% no inverno; as águas do Oceano Austral tornaram-se corrosivas para as conchas e outras estruturas biológicas formadas por carbonato de cálcio; a acidificação e aquecimento do Oceano levaram a uma reorganização profunda das comunidades biológicas e as invasões biológicas aumentaram substancialmente.

De acordo com o cenário das baixas emissões, o ambiente físico da Antártida e do Oceano Austral permaneceram, em muitos aspetos, similares a 50 anos atrás; a temperatura da Antártida e das águas do Oceano aumentaram menos de 1ºC; as plataformas de gelo diminuíram ligeiramente (<15%) tanto no verão como no inverno; as perdas na plataforma de gelo do Mar de Amundsen continuaram, levando a um aumento de 6 cm de nível do mar entre 2000 e 2070; o pH do Oceano Austral baixou ligeiramente acabando por estabilizar e as águas permaneceram saturadas em relação à aragonite; algumas populações de animais declinaram mas outras adaptaram-se, resultando numa menor perda de biodiversidade do que inicialmente previsto; nenhuma das espécies mais invasoras do mundo se estabeleceu na Antártida.

Embora ambos os cenários sejam especulativos, as escolhas que fizermos durante a presente década determinarão o futuro da Antártida. É urgente que se adotem medidas que promovam a proteção da Antártida e, consequentemente, reduzam o risco de alterações climáticas profundas em todo o mundo.

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Fonte: S. R. Rintoul, S. L. Chown, R. M. DeConto, M. H. England, H. A. Fricker, V. Masson-Delmotte, T. R. Naish, M. J. Siegert and J. C. Xavier, Choosing the future of Antarctica. Nature, 2018, 558, 233–241. doi: 10.1038/s41586-018-0173-4

Autor: Guilherme Jeremias

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