Uso do conteúdo estomacal de pinguins para estudar a ecologia de lulas e polvos

Os pinguins, um dos grupos mais abundantes de aves no Oceano Austral, alimentam-se de cefalópodes (e.g. lulas e polvos), entre outras espécies marinhas. Um estudo recente, liderado pelo nosso Hugo Guímaro estudou a dieta dos pinguins das Snares, Eudyptesrobustus,uma espécie endémica das ilhas das Snares, Nova Zelândia, para avaliar a importância de cefalópodes na alimentação destes pinguins, assim como o nível trófico e o tipo de habitat que os cefalópodes ocupam. Estes pinguins podem vir a encontrar-se ameaçados devido à sua reduzida capacidade de forrageamento (procura de alimento) e ao facto das suas áreas de reprodução serem limitadas.

Os cefalópodes encontrados na dieta desta espécie de pinguim foram obtidos através de análises estomacais, por regurgitamento do conteúdo do estômago. Estes cefalópodes são identificados, na maioria dos casos, através da presença de bicos, pois são estruturas duras, quitinosas e resistentes à digestão, que podem providenciar informações sobre qual a espécie, distribuição, abundância relativa, tamanho, estágio de vida e nível trófico dos cefalópodes.

Em primeira instância recorreu-se à medição e determinação da massa dos bicos e à análise da coloração do bico (escurecimento), de forma a identificar quais as espécies de cefalópodes e qual o estágio de maturidade dos mesmos, respetivamente. Os resultados demonstraram que o pinguim das Snares se alimenta de três espécies diferentes de cefalópodes: Nototodarussloanii, Onykiaingens (duas espécies de lulas) e Octopuscampbelli(uma espécie de polvo), sendo que todos os indivíduos das três espécies eram juvenis.

De seguida, indicadores de carbono (δ13C) e azoto (δ15N) foram medidos nos bicos dos cefalópodes para inferir o habitat e o nível trófico dos cefalópodes, respetivamente, ao longo do seu ciclo de vida (ex. adultos vs juvenis).

Os investigadores descobriram que:

· As espécies de lulas, N.sloanii e O.ingens, têm um habitat semelhante na plataforma continental das Ilhas das Snares. Os valores de δ13C destas espécies são consistentes com os valores das águas sub-Antárticas/sub-Tropicais, indicando que estas lulas vivem nestas águas;

· A espécie de polvo, O.campbelli,apresentou um valor de δ13C mais baixo, sugerindo que este polvo tem um habitat mais a sul que as espécies de lula;

· O.campbelliapresentou valores de δ15N superiores aos de N.sloaniie O.Ingens, sugerindo que o polvo consome presas de nível trófico mais elevado quando comparado com as espécies de lula.

Alterações climáticas, mais concretamente o aumento da temperatura dos oceanos, pode influenciar a disponibilidade e a diversidade dos cefalópodes das ilhas das Snares. Esta e outras ameaças, tais como a pesca excessiva, a captura acidental e o esgotamento de stocks, podem pôr em risco o acesso dos pinguins às suas presas e aumentar a ameaça a esta espécie endémica de Pinguim das Snares.

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Fonte: Guímaro, H., D. Thompson, V. Paiva, F. Ceia, D. Cunningham, P. Moors, and J. Xavier. Cephalopods habitat and trophic ecology: historical data using snares penguin as biological sampler. Polar Biology:1-12. https://doi.org/10.1007/s00300-020-02776-2

Autora: Joana Fragão

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