Mercúrio na cadeia alimentar: Impacto das Mudanças Climáticas?

O artigo examina como as mudanças climáticas e o aquecimento das águas do Oceano Austral podem aumentar a disponibilidade do mercúrio (Hg) na cadeia alimentar marinha da Antártida, devido à libertação de Hg armazenado no gelo e ao aumento das taxas de metilação por microrganismos. O estudo focou-se na biomagnificação de Hg na cadeia alimentar da Península Antártica, uma das regiões que mais se aquece no mundo. Utilizando isótopos estáveis de carbono (δ13C) e nitrogénio (δ15N) para estimar habitats de alimentação e níveis tróficos, respetivamente, a concentração total de Hg (T-Hg) foi medida em várias espécies, desde o krill antártico Euphausia superba até predadores como pinguins, aves e mamíferos marinhos (Figura 1).

Figura  1: Representação esquemática de possíveis vias de biomagnificação do mercúrio ao longo da cadeia alimentar do Oceano Austral.

As assinaturas de isótopos estáveis e as concentrações de Hg foram medidas em diferentes espécies, incluindo pinguins-de-barbicha, skuas, gaivotas, petréis-gigantes-do-sul e focas-elefantes-do-sul. Diferenças significativas nos valores de δ13C entre as espécies foram observadas, com grande sobreposição entre as aves marinhas e as focas. Diferenças nos valores de δ15N refletem variações na dieta e posição trófica. As concentrações mais baixas de Hg foram encontradas no krill (0,007 ± 0,008 μg∙g–1) e as mais altas no petrel-gigante-do-sul (12,090 ± 14,177 μg∙g–1).

Os resultados mostraram uma relação positiva entre as concentrações de Hg e os níveis tróficos, com a biomagnificação do Hg a aumentar quase duas vezes em cada nível trófico. Este estudo sugere que as interações tróficas são as principais vias de biomagnificação do Hg nos ecossistemas do Oceano Austral. Destaca ainda que as concentrações de Hg podem aumentar em organismos marinhos devido ao aquecimento global, que aumenta a metilação de Hg e a sua disponibilidade em águas de baixa oxigenação. Predadores de longa vida e alto nível trófico, como algumas aves marinhas e focas, são especialmente vulneráveis aos efeitos do Hg.

O estudo conclui que a biomagnificação de Hg nas cadeias alimentares da Península Antártica resulta em altas cargas de Hg nos predadores do topo. Com o aumento das temperaturas globais, espera-se que as concentrações de Hg aumentem, potencialmente causando efeitos negativos significativos nos organismos antárticos. O artigo alerta para a necessidade de mais estudos para compreender completamente como as diferenças taxonômicas, geográficas e ecológicas influenciam a dinâmica do Hg nos ecossistemas marinhos da Península Antártica.


Referência: Matias, R. S., Guímaro, H. R., Bustamante, P., Seco, J., Chipev, N., Fragão, J., … & Xavier, J. C. (2022). Mercury biomagnification in an Antarctic food web of the Antarctic Peninsula. Environmental Pollution304, 119199.

DOI: 10.1016/j.envpol.2022.119199

Autora: Laura Lopes

Partilhar